Ver, viver e ter tudo de novo e de trás pra frente.
O porta-retratos caído, partido, estilhaçado sobre o chão.
Os rostos divididos por uma fissura no papel. Até que a celulose se refaz e a
fissura se desfaz. Aos poucos, os fragmentos de vidro fino se aproximam e se
encontram, também apagando qualquer vestígio de imperfeição que pudesse ficar para
trás. A madeira encontra suas arestas e os vértices se unem, enquadrando a
figura sob o vidro translúcido. Num movimento antigravitacional, o corpo desliza
pelo vento e baila em direção à lisa superfície da penteadeira.
Então observo com olhos cansados a imagem de nós dois, e
assim o faço pelo simples fazer, ou talvez para me lembrar de que gosto de me
lembrar de você, embora essa lembrança me faça querer me afastar. Controverso,
incerto, inseguro, inexplicável e encerrado.
Acabou. O que restam são estilhaços, e tudo o que se pode
fazer é rebobinar e admirar por um instante, que deve ser breve, e depois
varrer os cacos para debaixo do tapete, guardar os pedaços do porta-retratos e
manter a fotografia guardada onde ninguém saiba, pois ela é a parte mais
importante dessa cena (que se repete e se repete), até que um dia ela se
desgaste e vá para aquela caixinha velha, onde ficam todas as outras fotos de
menor valor.
Mas por enquanto deixe-a na segunda gaveta, por favor.
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