Sei que um ônibus cheio não é o cenário mais romântico, mas,
feliz ou infelizmente, é nele que acontece o que narro. Quatro ou seis cabeças
alinhadas obstruem a vista da frente. Os bancos altos contribuem, assim como as
pessoas em pé. Não vejo muito além de rostos cansados ou sonolentos ou as duas
coisas, indo ou vindo de ou para casa. Não sei. Estou de olhos fechados e, nesse
instante, o mundo se resume às minhas agruras, pensamentos e silêncios. Daqueles,
muitos afluem e vez ou outro me vem um ou outro que me faz lembrar você;
aquelas coisas todas, nossa vida, flashes, frames, momentos, frases soltas,
palavras que dissemos sem querer e querendo, nada mais do que eu e você em toda
a nossa infinidade. Mas depois... Depois me vem a incerteza de que você voltará
a fazer parte da minha vida e de que um dia teremos outros momentos para
eternizar. Então a boca se torna amarga e a tarde perde um tanto de sua formosura
por um instante ou dois.
Mas, seja pelo motivo que for, se é que posso dizer que
existe um motivo por trás disso, é costumeiro que, quando me encontro vagando pelo
caminho nebuloso desses pensamentos de incertezas, meus ouvidos se deparem com
uma canção cujas primeiras palavras são cantadas em coro: “it’s alright. It’s alright...”. Duas vezes. A música do celular
tocando em modo aleatório. As vozes são de mulheres negras, entre duas e quatro
delas. Sinto que a voz delas sorri, bem como sinto que a melodia e tudo o que
acompanha a música é embargado de esperança; a esperança de que tudo vai mesmo
ficar bem, como dizem as coristas.
Muito, muito provavelmente se chamaria isso de coincidência,
das meras. Eu não. Gosto de pensar que é providência divina. Um coro de vozes
de esperança soprar nos meus ouvidos que “vai ficar tudo bem” exatamente quando
são essas as palavras que minha alma precisa ouvir?... Não sei. Acho romântico,
sublime, enunciativo, não sei. É uma ideia que me apraz. Já que não tão cedo
terei as respostas para todas as minhas dúvidas, espero um dia poder ouvir essa
mesma canção e dizer: eu sabia que elas estavam certas. Eu sabia.
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