sábado, 21 de julho de 2012

Aquele vestido bege

O relógio da estação marcava cinco horas. Lá estava eu, sentada num dos bancos próximos à plataforma, como de costume, esperando que ele voltasse para mim. Todos os dias a mesma coisa, mas eu não me incomodava. Eu o amava, e encontrá-lo todas as tardes na plataforma central da estação era a melhor coisa do dia.

Eu usava o meu vestido preferido, aquele vestido bege com detalhes em branco, um pouco rodado, que me deixava um tanto jovial. As pessoas passavam junto com as horas, e logo as cinco da tarde se tornaram seis. Permaneci sentada, esperando que meu amado voltasse para mim. Não me preocupei; ele era um homem bastante atarefado e, às vezes, atrasava-se com seus afazeres. Nunca me preocupei. Permaneci sentada.

Acabava de tomar meu terceiro capuccino no Café Central quando o avistei saindo do trem das seis e meia. Deixei dinheiro sobre a mesa e caminhei, feliz, ao seu encontro. Um sorriso iluminava meu rosto e a brisa da tarde me guiava em direção àquele homem que eu tanto amava.

– Boa tarde, meu amor! – disse-lhe eu.

Deu-me apenas um beijo no rosto e nenhuma resposta. Olhou-me debaixo a cima duas vezes, franziu o cenho e perguntou-me com voz séria:

– Por que veio com esse vestido?
– Qual o problema com o meu vestido?
– Já disse que não gosto desse vestido.
– Mas...
– Não gosto da cor, além do mais ele é muito decotado. O que vão pensar de uma dama sozinha na estação vestida assim?
– Mas...
– Vamos.

Seguimos caminho. Não trocamos muitas palavras. Ele estava contrariado e eu, chateada. Eu o esperara por uma hora e meia e, quando finalmente nos encontramos, recebi única e exclusivamente algumas palavras de censura contra o meu melhor vestido. Um beijo e mais nada. Nem um abraço, nem uma palavra gentil, nem um sorriso de contentamento, nem um pingo de cortesia.

Perdemos aquela tarde e toda a noite. Não sei dizer ao certo o que senti, mas ele não se dispôs a tentar consertar.

– Custar-lhe-ia tanto assim agradar o seu marido? – perguntou-me ele quando tentei, inutilmente, argumentar.

Ao chegarmos em casa, preparei o jantar, que comemos em silêncio, esperei-o tomar banho e, depois, deitamo-nos, cada um virado para um lado da cama, tendo dito, além de um “boa noite” inexpressivo, poucas e ordinárias palavras que não conseguiram quebrar aquele sentimento ridículo que pairava entre nós simplesmente por causa de um vestido... Apaixonada que sou, sentia saudades do meu homem; esperava-o por todo o dia e, geralmente, era bem recepcionada quando o encontrava pontualmente às cinco da tarde na estação. Mas hoje... Hoje não foi bom. Hoje foi um dia em que não o amei, e ele tampouco a mim. E não dispomos de muito tempo. Tudo por causa de um vestido, céus!

O que devo fazer? É meu vestido favorito... Não sei se continuo a usá-lo e não o deixo saber, não sei se o jogo fora, não sei se finjo que nada aconteceu e apenas evito usá-lo perto dele... Não, não me custaria nada agradar-te, mas é que eu senti tanto a sua falta e, quando eu te vi, você foi tão rude que... Bem, melhor deixar esse vestido no armário. Amanhã decido o que fazer.

2 comentários :

Seja gentil. Palavra feia não se diz.