quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Reclusão

Não é estar sozinho. Também não é solidão. Na verdade é, mas uma de um tipo diferente. Uma solidão ensimesmada, que independe do fator estar sozinho, ainda que seja aquele sozinho cercado de pessoas. É algo íntimo, introspectivo, como um embrião, que cresce mas não é possível dar à luz, pois ele é Seu demais para se externalizar. É como ter-se como único capaz de compartilhar a própria angústia, pois a felicidade desconhece esse tipo de confinamento. A solução talvez não exista, pelo menos sem a ajuda de um terceiro. Amigos, amo a todos, mas não quero aborrecê-los com o que não lhes diz respeito. Além do mais, de preconceitos já bastam os meus e de julgamentos, os do mundo. Quero compreensão, aceitação e um afago, se possível, mas de quem, senão de meus outros eus, eu poderia esperar tal comportamento? De ninguém, eu arriscaria. Talvez esteja aí a função da poesia, que não me agrada, mas também não me maltrata. É como uma companheira neutra, que aguarda junto comigo nesta sala de espera que é como água potável: incolor, insípida e inodora. Antes fosse amarga como a vida ou doce feito os sonhos que eu um dia tive, mas não é. Continuo a esperar, eu e a poesia, por um amanhã que não sei se um dia virá. Mas por isso estamos aqui, na sala de espera, que carrega esse nome por uma razão. Quando for minha vez e meu nome soar, caminharei rumo ao meu destino com passos firmes e queixo erguido, mas, enquanto isso não acontece, de pernas cruzadas permanecemos, eu e a poesia.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Soneto #3

Vivendo um dia de cada vez
Aguardo a incerteza do amanhã
Cada dia demora um mês
Às horas lentas das minhas manhãs

Ainda paira a incerteza
Mas no fundo eu acredito
Ao meu lado, a tristeza
Me mantém bem protegido

Continuo a orar
E pedir-te a Deus comigo
Com toda a minha vontade

Continuo a te amar
E a querer ser Um contigo
Por toda a eternidade

Soneto #2

Os dias caminham para o fim
Do prazo que criamos outrora
Sem a outra metade de mim,
Receio que tenhas ido embora

Quando olho pra trás é que percebo
O caminho longo e tortuoso.
Por vezes chorei e tive medo
Por outras, amor em pleno gozo

As lembranças estão vivas.
Aproxima-te de mim
E em meu peito te recosta

És o amor da minha vida
Mesmo que isso acabe assim,
Sem que eu tenha as minhas respostas

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Soneto #1


E na clausura voluntária
Fui tolhido da minha liberdade
Nesta sala vazia ordinária
Não posso exercer a minha vontade

Os versos, confesso, me chamam
Embora eu não os declame
Aventurados aqueles que amam
E não mancham a vida com sangue

Se eu pudesse um dia ir embora
Talvez eu fosse pra longe
E ouvisse essa voz que me chama

Mas não posso fazê-lo agora
Saudades dos tempos de ontem
Do calor de quem sei que me ama

A máquina e o ancião


Tempo.

Queria ter tempo. Não que eu não tenha, ou que eu não tenha o bastante. Na verdade eu não tenho, de fato, mas é de outro tempo que eu estou falando. É um tempo nostálgico, bucólico, modesto, com um sabor diferente do tempo ocioso que muitos desejam, assim como eu. Mas não é esse, é o outro. Queria ter o tempo das pessoas que vejo partirem ou chegarem dentro de ônibus de viagem; queria ter o tempo das pessoas dentro dos aviões; queria ter o tempo do final da tarde, da volta pra casa depois do trabalho; o tempo que os casais de adolescentes que gozam da primeira paixão têm para andarem de mãos dadas pelas ruas arborizadas; queria ter o tempo da relva, da campina, da casinha no meio do campo infinito sob o céu cheio de nuvens fofas, brancas; o tempo de se sentar sob a árvore e fechar os olhos; o tempo de estar envolto pelo cobertor num dia frio e chuvoso; o tempo de comer pipoca e assistir a um filme no sofá da sala; de ir ao mercadinho da esquina caminhando, sem pressa; de pegar o violão e brincar de fazer música; de pegar o caderninho e brincar de fazer versos...