quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Prova

Silêncio profundo. Ao redor, cabeças baixas e concentradas. À minha frente, sua mesa bagunçada. Meus olhos atentos. Lápis na boca, de propósito ou não. Dois metros e algumas circunstâncias nos separam. Sua cabeça, baixa como as demais, se ergue. Nossos olhares se cruzam. Sorrio mas você parece não entender, e me olha como se tentasse fazê-lo. Não sou clara o bastante, mas você é esperto. Ajeito o cabelo e volto os olhos ao papel, feito os demais. Tento disfarçar, sem sucesso. Contra minha vontade, meus olhos procuram os seus, que já procuravam os meus antes. Devoro-te, mas não decifra-me. Sorrimos de novo e sua cabeça se inclina para a direita como quem pergunta algo que não respondo. Você não percebe? Cruzo as pernas, sem esperança, mas sem pesar. Somos eternos porque você não me concretiza; se o fizesse, talvez nos perdêssemos. Jamais saberemos. Você volta a cuidar de seus papéis; eu, dos meus. Com o lápis que segurava na boca, escrevo seu nome na prova, depois o meu. Talvez, se eu for a última a sair da sala... Bem, nunca saberemos. É melhor ir agora. Boa noite, adeus.