sexta-feira, 4 de abril de 2014

Caneta vermelha

Dentro da sala, ouvia-se apenas o barulho do relógio da parede ticando, segundo após segundo, infinitamente. O silêncio era total e absoluto, irrompível. Enquanto aquelas dezenas de alunos faziam suas provas concentradamente, Otto, ou Professor Buckley, corrigia outras dezenas de provas sobre sua mesa bagunçada. Aquela vida já não lhe agradava tanto assim. Não mais. Onde fora parar sua juventude?, ele pensava. Gastara todo seu tempo e sua energia estudando, especializando-se, até que, naquele momento, já chegando aos quarenta de idade, ele estivesse no degrau mais alto de sua vida acadêmica: Otto já não tinha mais para onde subir; poucos eram tão bons no que faziam quanto ele. Processamento de Imagens, matéria que ele ministrava na melhor universidade pública do estado. Mas Otto sentia que não era bom o bastante — não como professor — e que seus alunos sentiam o mesmo. Não considerava que a disciplina que ministrava fosse difícil: doutorara-se nela, afinal, mas nenhum de seus pupilos demonstrava grande interesse ao ouvi-lo falar, sempre de forma cadenciada, precisa, com uma voz profunda, quase sexy. Talvez aquele aluno da terceira cadeira se interessasse, julgando pelo olhar, mas só ele não era o bastante. 

Chovia, e muito. Logo seria hora de ir embora; chegar em casa, terminar de corrigir aquelas provas, almoçar, colocar comida para o gato, assistir aos programas de esporte na cadeira de balanço, cochilar um pouco, acordar, preparar uma xícara de café, tomá-la, tomar banho, colocar comida para o gato, voltar ao trabalho, corrigir trabalhos, preparar aulas, analisar projetos, entregar projetos, responder e-mails, ler mais algumas páginas de Ulysses, assistir ao jornal da noite, desligar a TV, rezar, dormir, acordar e começar de novo. Pelos próximos sete dias, e depois pelas próximas semanas, e pelos meses, até os anos, talvez para sempre. A vida de Otto era exatamente essa, com sutis alterações na ordem dos eventos — leve-se em conta, ainda, que, pelo menos duas vezes por semana, Otto alternava páginas de entretenimento adulto entre um e-mail e outro. Morava sozinho, pois não gostava de dar satisfações a ninguém, e permanecia solteiro desde muito tempo.

Recolhida a pilha de papel ao final do tempo estabelecido para a realização da prova, Otto organizou seu material sobre a mesa. 

— Tchau, professor Buckley!

O rapaz da terceira cadeira era o único que se despedia. Sempre. Otto nunca respondia. Seus alunos o deprimiam: tiravam notas ruins, faltavam às aulas, iam mal nas provas, eram reprovados. Um bando de incompetentes. E, dia após dia, Otto continuava sua labuta infrutífera, afinal, precisava pagar as contas e colocar comida na mesa — e na bacia do gato, também. Então ele foi. Correu até o estacionamento da universidade para não se molhar muito na chuva, tirou o carro da vaga, guiou pelas ruelas da universidade, saiu dela, ganhou a avenida em que ficava a instituição, fez a rotatória, dirigiu dentro do limite de velocidade permitido, sem brigar com ninguém no meio do trânsito intenso da hora do almoço em dia de chuva, virou a primeira à esquerda, depois à direita, parou no semáforo e apagou quando um caminhão de carga pesada colidiu violentamente contra seu carro novinho.

Uma dor lancinante na cabeça e um mal estar terrível, acompanhados de um silêncio ensurdecedor e um cheiro de álcool de origem desconhecida tomaram conta dos sentidos. Quando conseguiu abrir os olhos, Otto olhou para cima, para frente, para os lados e reconheceu aquele lugar, ou o que ele parecia ser: um quarto de hospital. Pequeno demais, mas um quarto. Ninguém por perto. Otto se inclinou sobre a maca e percebeu que em seu corpo havia grudados inúmeros fios. Um aparelho ao lado monitorava os batimentos cardíacos e curativos de diferentes tamanhos dominavam seu corpo. Tudo doía.

— Enfermeira! – Otto gritou. 

Sua voz reverberou e ecoou cinco vezes, mas não houve retorno. A porta estava fechada e, perto da maca, não havia nenhuma campainha ou qualquer dispositivo que servisse para chamar a atenção dos profissionais dali. Otto queria explicações. Onde estava? E por quê? O que havia acontecido? Mas a maldita enfermeira não respondia ao chamado. Todas as três tentativas foram inúteis. Juntando suas forças, Otto decidiu se levantar. Muito lentamente, após se livrar de todos aqueles fios, que pareceram estranhamente facilmente removíveis, conseguiu se sentar na maca e apoiar o peso do corpo nos próprios braços antes de colocar os pés no chão. Vestia um avental verde-água; verde tanto quanto as paredes do quarto, embora estas fossem mais escuras e de outro tom. Sobre uma das cadeiras, havia um aquário, mas o peixe dentro dele pouco se mexia. Em uma das paredes, uma reprodução de “Os Amantes”, de René Magritte. A porta de madeira bege estava agora semiaberta, e até ela Otto foi.

Quando a abriu por completo, cegou-se: não de trevas, mas de luz. Cada milímetro de tudo que o circundava era branco. Não havia paredes nem lados nem curvas nem chão nem teto nem céu nem inferno: apenas branco. Olhando para baixo, Otto conseguiu visualizar os próprios braços e pernas, e, por isso, concluiu que não estava cego. Embora um tanto aterrorizado com aquele cenário, ele caminhou adiante, instintivamente; e, enquanto caminhava, olhou para trás, e o quarto em que estava permanecia no mesmo lugar, como se fosse um container no meio do deserto, e nada mais além das paredes claras daquele container se distinguia da brancura desesperadora daquele lugar. Foi ao virar para frente novamente que Otto viu, aproximando-se de seu campo de visão, uma mesa. Em frente à mesa, uma cadeira azul claro; atrás dela, de cabeça baixa, um homem vestido de branco, escrevendo com uma caneta vermelho-brilhante sem parar. Um médico, Otto concluiu. Apressando os passos doloridos, Otto seguiu em direção à mesa. 

Quando a alcançou, sentou-se na cadeira azul antes mesmo de ser percebido. Andara pouco, mas se sentia exausto; a respiração estava pesada e os músculos pareciam não conseguir sustentar o peso do próprio corpo.

— Doutor? – chamou.

— Só um minuto – o homem respondeu, sem desviar os olhos do que escrevia.

Novamente, Otto olhou para os lados. Nada além da alvura infinita. E olhou para trás, mas o quarto em que estava já havia sumido do campo de visão. E olhou para frente novamente e gerou do fundo de seus pulmões um grito surdo de terror ao se deparar com aquela figura que, agora, o fitava intensamente.

— Quem-- O que é você?! – ele perguntou quase irracionalmente.

— Mas que pergunta idiota é essa? – respondeu o homem. — Você não me reconhece?

— Você... você... é eu! 

Em frente a Otto estava um simulacro imaculadamente igual a ele; igual em todos os traços: em cada fio de cabelo, no azul dos olhos, na textura da pele, no tom da voz, nas rugas de expressão, no queixo, nas mãos. Uma réplica. 

— O que é isso? O que está acontecendo? – continuou Otto, que se levantou e deu dois passos para trás, afastando-se rapidamente daquela criatura.

— Eu é que pergunto o que é isso. Você não tem espelho em casa? Nunca se viu? Nós somos eu, ou nós somos você, ou você é eu e eu sou você... nós somos nós: a mesma pessoa.

— Mas que brincadeira é essa? Alguém me explica o que está acontecendo, pelo amor de Deus?!

— Alguém? Deus? Você está vendo outra pessoa aqui além de nós dois? E você quer fazer o favor de se acalmar e se sentar? – o médico apontou a cadeira à sua frente com a palma da mão, mantendo a calma, embora sua voz insinuasse uma pitada de impaciência. 

Otto continuava fitando aquele homem — ou a si mesmo — com olhos estarrecidos. Aguardando que ele se recompusesse, Dr. Otto terminou de mexer com os papéis em que escrevia, deixando-os de lado assim que Otto, depois de muita hesitação, se aproximou novamente e se sentou na cadeira azul.

— Ok, Otto, como você se sente? – perguntou Dr. Otto, cruzando os braços sobre a mesa.

— Eu... eu não sei. Tudo dói. O que houve comigo? E por que eu estou me vendo em você?

— Você se envolveu em um acidente de carro, não se lembra disso?

— Não... Eu morri?

— Você se sente morto?

— Eu não sei; nunca morri pra saber... Mas este lugar... você... digo, você é eu; eu estou vendo dois de mim... Isso é real? Você existe? Por que estou aqui?

— Você está fazendo perguntas muito difíceis. O que é real? O que é existir? Você acha que você é real?

— É claro que eu sou real! Eu tenho uma vida! Eu não sei como vim parar aqui!

— Vida. Sim, claro. Eu sei muito sobre a sua vida.

— Como sabe? 

— Eu sou você, ora. Isso não ficou claro ainda? 

— Você não é eu! Eu não sou médico!

— Ah, bom – Dr. Otto se ajeitou na cadeira, deixando a caneta vermelho-brilhante sobre a mesa. — Agora você tocou num ponto importante. Tomando base por aí... de fato, eu não existo. Mas existo dentro de você.

— Quem é você?

— Eu sou eu; digo, sou você, mas não nessa vida. Eu sou médico, você vê, e a ambiguidade da minha existência é culpa sua.

— Eu não estou entendendo uma palav--

— É muito simples – o médico interrompeu, inclinando-se para frente, com os cotovelos apoiados sobre o tampo. — Você se lembra de quando a mamãe encontrou aquele gatinho na rua, quando éramos criança?

— Lembro, mas isso faz tanto tempo... Eu não quis ficar com o gato; falei pra mamãe deixá-lo na rua... Não foi isso que ela fez?

— Foi. Exatamente isso; e essa é a única razão pela qual eu não existo. 

— Como?

— Se você tivesse querido ficar com aquele gatinho... Bem, você não existiria. E muito provavelmente não estaria aqui agora.

— Eu não... estou entendendo nada...

Eu quis ficar com o gatinho. Levei ele pra casa e cuidei dele durante quase um ano. Até que, um dia, ele escapou pra rua e, enquanto eu corria atrás dele pra buscá-lo de volta, um carro o atropelou e o matou na hora. E eu vi tudo de perto. E, como eu era uma criança, é claro que não havia nada que eu pudesse fazer... então eu o vi morrer diante dos meus olhos. Me senti um fracasso. E, daquele dia em diante, eu decidi que iria dedicar a minha vida a salvar a dos outros. E aqui estou, salvando a sua — a nossa.

— Mas... – Otto balançava a cabeça, que ainda doía, cada vez mais confuso, tentando digerir aquilo tudo. — Você... eu nunca quis ser médico!

— Porque você nunca quis ter aquele gato. Só por isso. 

Otto se recostou na cadeira. Olhou bem para os próprios olhos e se sentiu perder num vórtice de volta ao passado. Uma decisão aparentemente insignificante poderia ter mudado o curso de sua vida inteira. Isso o deixou curioso.

— O que mais é diferente?

— Hum... Ah! Eu sou casado e tenho duas filhas.

— Isso é impossível. Eu sou gay.

Você é gay. Eu não.

— Tá me dizendo que eu sou gay porque fiz uma escolha errada?! – Otto arregalou os olhos e se inclinou para frente, segurando a borda da mesa com as duas mãos. 

— Não é bem assim. 

— Então o que eu fiz de errado?

— Nada, ora. E por que está tão surpreso? Ser gay não é certo ou errado, você sabe disso melhor do que eu, e ser gay nunca foi, nem de longe, um problema pra você ou qualquer outra pessoa. Nossos pais sempre lidaram muito bem com isso e seus amigos também nunca se importaram. Agora, se não me engano... Hum... Foi, foi depois, sim. Nós tínhamos o quê? nove, dez anos? Ou menos. Não me lembro. Foi num dia em que o tio Bob nos chamou pra passar um final de semana na casa dele, você lembra?

— É claro.

— Ah, que bom! O que foi que aconteceu lá?

— Ora, nada demais! Tio Bob não era pedófilo e nunca abusou de mim!

— Mas quem foi que disse isso, meu Deus? – Dr. Otto se indignou. — Você não se lembra? Qual foi a primeira coisa que nós — aliás: você, tio Bob e os primos fizeram? 

— Fomos brincar na piscina, ué.

— Pelados.

— E daí? Nós éramos crianças!

— E daí que tio Bob já era um homem adulto muito bem desenvolvido e, aos nove anos, você viu o primeiro pênis da sua vida — além do seu, é claro.

— E eu sou gay só por causa disso?!

— Não “só”. O primo Nil, que, na época, já tinha uns treze anos, não tinha vindo de outro estado pra passar o final de semana na casa do tio Bob também?

— Sim, ora.

— E vocês, anos depois, não tiveram um caso?

— Sim, mas eu não tinha nem quinze anos aí!

— Pois é... Quando tio Bob nos convidou pra ir pra casa dele, eu recusei; preferi continuar zerando Top Gear 3000. Por isso, nunca o vi pelado, assim como também nunca conheci o Nil, porque, depois desse dia, ele nunca mais voltou à nossa cidade, e eu nunca mais vi outro homem nu até descobrir a pornografia, aos doze. Aliás, o Nil gostava mesmo de você, sabia? Ele só voltou aqui depois desse episódio na casa do tio Bob por sua causa.

— Meu Deus... – Otto se recostou à cadeira e segurou a cabeça com as duas mãos, olhando para o alto, onde, agora, havia uma lâmpada desligada. — Por que eu estou aqui? – perguntou, voltando a olhar para si mesmo.

— Eu também não sei. As pessoas não vêm aqui por um motivo; elas simplesmente aparecem.

— E como é que eu saio daqui? Eu preciso voltar.

— É fácil, mas ainda é cedo... Vamos conversar mais um pouco. Me fale sobre a sua vida. Como ela é?

— Miserável. Duplamente miserável, agora que eu descobri que poderia ter sido rico sendo médico, mas não fui por causa da porcaria de um gato.

— Que pensamento pequeno... Eu sou rico, sim, mas isso não quer dizer que eu sou feliz. Trabalho o tempo todo, tenho duas filhas pra cuidar, uma esposa que trabalha tanto quanto, senão mais, que eu... Não tenho tempo de gastar meu dinheiro. Além disso, dinheiro nunca foi seu problema.

— Dinheiro é o único problema que eu não tenho. Minha vida é um saco — você sabe.

— É claro que sua vida é um saco. Você chega em casa, termina de corrigir provas, almoça, coloca comida pro gato, assiste aos programas de esporte na cadeira de balanço, cochila um pouco, acorda, prepara uma xícara de café, bebe, toma banho, coloca comida pro gato, volta ao trabalho, corrige trabalhos, prepara aulas, analisa projetos, entrega projetos, responde e-mails, lê algumas páginas de Ulysses, assiste ao jornal da noite, desliga a TV, reza, dorme, acorda e começa de novo, e se masturba três vezes por semana. 

— Não precisa me lembrar.

— É claro que eu preciso! Olha quanto tempo você tem e olha quanto tempo você perde! Sua vida é universidade e RedTube nas horas vagas. Vá fazer uns amigos, se arrumar, sair, paquerar, beber, tomar um porre, sei lá!  Eu aqui fazendo plantões de doze horas, correndo pra casa pra ficar algumas horas com a minha família antes de começar tudo de novo e você aí, com a vida ganha, reclamando! Nem tudo é processamento de imagens, probabilidade e processos estocásticos! Quando foi a última vez que você transou?

— Não sei... Faz tempo.

— Pois é. O tempo está passando; logo logo você vira um coroa ranzinza e ninguém vai querer saber de você – Dr. Otto pegou novamente os papéis em que mexia mais cedo e tornou a abaixar a cabeça, escrevendo e falando com Otto ao mesmo tempo. — Considere este nosso encontro uma segunda chance, e, quando voltar lá pra cima, vê se faz as coisas direito.

— Tá, tá bom. Vou pensar. 

— E uma última recomendação: o aluno da terceira cadeira. Só você não percebe o quanto ele te dá mole. Fique de olho.

— Por que diz isso? Do que você sabe que eu não sei?

— A consulta está encerrada. Sem mais perguntas.

— Argh! Tá! E como é que eu saio daqui?

— Ah, sim, é só abrir os olhos.

— Mas eles já estão abertos.

— Não, Otto, abra os olhos.

— Mas eles--

— Abra os olhos!

Soou como um trovão, que ecoou do lado de fora do hospital. A chuva engrossara. Ao abrir os olhos, Otto se viu numa cama de hospital, e, ao seu lado, uma enfermeira fazia anotações em uma prancheta. O corpo todo parecia dormente e um cansaço extremo pesava a respiração. 

— Ah! Você acordou! Como se sente?

— Cansado... O que aconteceu?

— O senhor sofreu um acidente de carro, mas não se preocupe: saiu quase ileso. Umas escoriações aqui e ali, mas nada grave. Sorte que estava com cinto de segurança, senão teria voado pela janela!

Ainda inseguro das últimas experiências, Otto perguntou:

— Onde está o doutor Otto?

— Doutor Otto?... Não tem ninguém aqui com esse nome. Só o senhor.

Talvez tudo tivesse sido um sonho.

— Logo o senhor vai ser liberado; não foi nada sério. Vai ficar tudo bem. Vou pegar alguns esparadrapos pra trocar o curativo da perna e já volto, tudo bem?

— Tá bom...

A enfermeira saiu do quarto, deixando o prontuário ao pé da cama. E, olhando por cima do próprio tronco, Otto viu a caneta vermelho-brilhante posta sobre o papel branco.

Pouco mais de uma semana depois, tudo estava sob controle novamente. Seguindo a rotina de sempre, Otto retornou a suas atividades. Levantou cedo, tomou café, colocou comida para o gato, se arrumou, pegou seus objetos e dirigiu até a universidade. Entregou as provas que havia corrigido, deu sua aula, esclareceu dúvidas e fez algumas correções junto com os alunos, não muito interessados, como sempre. Mas tudo bem. Ao final da aula, todos foram saindo rapidamente. 

— Tchau, professor Buckley!

— Tchau, Dan. Até logo.

Dan parou e ficou; já estava quase alcançando a porta. Era a primeira vez que Otto respondia seu cumprimento, o que fez um sorriso pueril nascer em seus lábios. A resposta de Otto foi espontânea, tanto que este só percebeu o que fizera ao ver que o rapaz permanecia parado, risonho à sua frente. Então, ainda espontaneamente — estranhamente espontaneamente — Otto disse:

— Você se saiu muito bem na prova. Parabéns.

Dan se reaproximou a passos lentos. Apenas os dois dentro da sala agora vazia.

— Sim... Estudei bastante. Gosto muito de Processamento de Imagens.

— Eu percebi. Você é um dos poucos, aliás; senão o único.

— Imagina. O senhor é um excelente professor.

— Obrigado. E pode me chamar de “você”.

— Oh, claro. Você... – Otto continuou guardando suas coisas na pasta, com ar aparentemente concentrado, enquanto Dan o admirava, segurando a mochila pendurada em apenas um dos ombros. — Bom, eu vou indo nessa.

— Tá indo pra casa? 

— Uhum.

— Não quer uma carona?

Dan ergueu as sobrancelhas e tentou disfarçar o entreabrir involuntário de espanto de seus lábios. Gaguejou duas vezes e perguntou, inocente:

— É sério isso?

— É claro que é sério. Aliás, eu tenho uma reunião aqui na faculdade daqui a menos de duas horas. Não quer almoçar comigo no shopping antes de eu te deixar em casa? Por minha conta.

— Ah... c-claro... sem... problemas...!

— Ok, então vamos.

Saíram, Otto e Dan, pela porta da sala e caminharam até o carro provisório de Otto, já que o seu havia sido destruído no acidente. A caneta vermelho-brilhante dentro do bolso da camisa. A enfermeira provavelmente não sentiria falta dela. Deixando a universidade, Otto dirigiu cautelosamente até o shopping. Um sorriso se formou discretamente em seu rosto, o que era até estranho, pois ele sorria pouco. Talvez fosse efeito da prescrição médica, que Otto se dispôs a seguir rigorosamente. A primeira dose acabava de ser administrada. Efeitos colaterais: não registrados. Que começasse o tratamento.

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